15.10.25 | Brasil
Caso Ellwanger: quando o antissemitismo é enquadrado como crime de racismo
O caso Elwanger foi um marco na história do Judiciário brasileiro. Siegfried Ellwanger foi julgado por racismo antissemita em 1989, a partir de ação interposta pelo Movimento Popular Antirracismo (Mopar), do MJDH, com participação da Federação Israelita do Rio Grande do Sul (FIRS) na fase judicial. Condenado no TJ, o réu recorreu ao STF, que, em março de 2001, manteve a decisão, numa iniciativa que, inclusive, favoreceu o movimento negro.
No acórdão sobre a condenação de Ellwanger, o Supremo também deixou claro que, embora a liberdade de manifestação do pensamento seja um direito garantido pela Constituição, ele não é um direito absoluto e há limites morais e jurídicos. E a legislação, quando define o crime de racismo, deixa bem claro que discurso de ódio é um desses limites, pois fere o direito à dignidade humana de quem é alvo desse discurso.
Duas frentes atuaram nessa vitória: a FIRS e o Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), com participação de Jair Krischke à frente, mas ainda com Mauro Nadvorny e Carlos Josias Menna de Oliveira (o advogado), além de Luís Milman e Luiz Francisco Corrêa Barbosa. Wilson Muller, na polícia, também teve papel destacado nesse episódio histórico. Os advogados Helena e Helio Neuman SantAnna também participaram ativamente desse processo.
A condenação pela 3ª Câmara do Tribunal de Justiça (segunda instância) ocorreu por 3 a 0 em 1996. Era de dois anos de prisão, mas foi convertida, mediante suspensão condicional da pena, em quatro anos de serviços comunitários. Ellwanger recorreu. Passou a alegar que judeu não é raça e que não cometera racismo. O detalhe é que, enfim, raça em tese não existe (mas o racismo, pela ignorância humana, sim). A alegação era inócua. E veio o ano de 2003, histórico. O STF negou, em 26 de junho, o derradeiro habeas corpus impetrado por Ellwanger. Na ocasião, o filósofo e jornalista Luis Milman, do MJDH, comentou: “O caso é ímpar, pela jurisprudência que fixará para futuras abordagens do preconceito racial”.
"O caso foi muito importante, pois a Corte chegou a um entendimento sobre dois pontos", afirma o jurista Celso Lafer, advogado, professor emérito da Faculdade de Direito da USP e ex-ministro das Relações Internacionais que atuou no julgamento como amicus curiae (convidado a dar seu parecer no tribunal sobre um assunto de grande relevância). "A primeira que antissemitismo se enquadra como crime de racismo. O segundo ponto foi sobre a amplitude da liberdade de expressão: existe ou não e quais os limites à liberdade de expressão", diz Lafer, que também é fundador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Embora o julgamento tenha sido sobre o caso específico de Ellwanger, ele teve repercussão geral, ou seja, implicações que vão além do caso e afetam a Justiça como um todo.
Quem foi Ellwanger
Siegfried Ellwanger, nasceu em 1928, natural do Candelária, Rio Grande do Sul, descendente de italianos, trabalhou como operário em algumas fabricas da região, alistando-se ao exército, onde permaneceu por três anos.
Em 1950 fundou sua própria empresa no ramo de ferro e aço. No entanto, mesmo tendo obtido algum sucesso optou pela venda da empresa, para que pudesse se dedicar aos seus estudos. Assim, surgiram seus livros, sendo assinados sob o pseudônimo de S.E. Castan, sendo fundado, posterimente, a editora revisão. Ellwanger se considerava “socialista”, mesmo defendendo os ideais de Adolf Hitler, que eram de extrema direita.
Ellwanger está vinculado a uma escola chamada revisionista histórica, a qual tem como ideia básica que não há fatos históricos inquestionáveis, no caso do Holocausto esta escola alega que não há fatos que comprovem que ele realmente aconteceu. O Holocausto na visão de Ellwanger seria um mito criado pelos próprios judeus, segundo ele haveria várias provas indicando que os fatos aconteceram de forma diversa daquela contada, um dos principais pontos defendidos por ele na obra “Acabou o gás... O fim de um mito” é de que as execuções em câmaras de gás nunca existiram, pois não havia estrutura para tal coisa na época.
Já em sua obra “Holocausto: judeu ou alemão?”, Ellwanger alega que o Holocausto era um mito, criado com o intuito de impedir que Hitler continuasse a aumentar seu poder econômico e político, pois ameaçava as potencias mundiais da época. Por conta disso a Alemanha teria sido a principal vítima da Segunda Guerra mundial e não os judeus.