30.10.23 | Mundo
“Dois reféns do Hamas”
Em artigo na Folha de S.Paulo, o sociólogo Demétrio Magnoli analisou os recentes episódios diplomáticos envolvendo o conflito Israel-Hamas e destacou que a recusa à condenação do grupo terrorista “descortina uma avaliação envenenada por opções ideológicas”. Diz o artigo: “Não se sabe ao certo o número de israelenses mantidos em cativeiro pelo Hamas. Dias atrás, porém, a organização terrorista capturou dois novos reféns, de alto perfil: António Guterres, secretário-geral da ONU, e o governo do Estado de Israel. O primeiro proferiu uma caprichosa justificativa para os atos de terror do 7/10. O segundo adotou como represália a negação de vistos a autoridades humanitárias da ONU, o que simboliza seu desprezo pela ajuda emergencial aos civis palestinos. O discurso de Guterres na ONU qualificou os atentados do Hamas como injustificáveis para, na sequência, argumentar que eles "não ocorreram num vácuo", mas no contexto de "56 anos de ocupação sufocante". No fundo, é a mesma lógica de vozes estatais da direita, como o presidente turco Erdogan, que descreveu o Hamas como "um grupo de libertação", e da esquerda acadêmica, como os professores da USP que atribuíram 'esse ponto de violência extremada' à 'ocupação' dos territórios palestinos. A recusa a uma condenação incondicional (por oposição à condenação retórica protocolar) do terror do Hamas descortina, além da ausência de bússola moral, uma avaliação histórica envenenada por prévias opções ideológicas. De fato, porém, o Hamas não surgiu da 'ocupação', não combate a ocupação e não prega a convivência entre o Estado judeu e um Estado palestino independente. O Hamas é um galho da árvore da Irmandade Muçulmana, organização fundamentalista islâmica criada no Egito em 1928 – ou seja, duas décadas antes da fundação de Israel. Sua atuação em Israel/Palestina começou em 1987, durante a primeira Intifada, que foi uma revolta civil e popular contra a ocupação israelense. Mas – eis o ponto! – o Hamas opunha-se ao método da Intifada original e logo escolheu a via do terror. A escolha refletia uma estratégia: a rejeição do projeto de paz em dois Estados”.