03.01.24 | Mundo
A curiosa história do judeu que, escondido na Holanda, criou uma revista satírica para desafiar os nazistas durante a 2ª Guerra
Matéria de Nina Siegal, do New York Times, publicada no jornal Estado de S.Paulo traz a curiosa história do judeu alemão Curt Bloch, que, escondido na Holanda durante a Segunda Guerra, criou uma revista satírica para desafiar os nazistas.
Por mais de dois anos, a casa de Curt Bloch foi o pequeno espaço sob as vigas de uma modesta casa de tijolinho à vista em Enschede, cidade holandesa perto da fronteira alemã. O sótão tinha uma única janela. E ele o compartilhava com outras duas pessoas. Durante esse tempo, Bloch sobreviveu na Holanda sob ocupação nazista contando com uma rede de pessoas que lhe davam comida e guardavam seus segredos.
Nesse aspecto, ele era um dos cerca de dez mil judeus que se esconderam na Holanda para fugir dos nazistas. Pelo menos 104 mil – muitos deles também procuraram refúgio, mas foram encontrados – acabaram nos campos de concentração.
Mas a experiência de Bloch foi diferente porque, além de sustento e cuidado, seus apoiadores levaram canetas, colas, jornais e outros materiais impressos que ele usou para produzir uma publicação surpreendente: uma revista semanal de poesia satírica.
De agosto de 1943 até ser libertado, em abril de 1945, Bloch produziu 95 edições de Het Onderwater Cabaret, algo como “O Cabaré Debaixo d'Água”.
Cada edição trazia artes, poesias e canções originais que muitas vezes tinham como alvo os nazistas e seus colaboradores holandeses. Escrevendo em alemão e holandês, Bloch zombou da propaganda nazista, reagia às notícias da guerra e ofereceu perspectivas pessoais sobre as privações dos tempos de guerra.
E ele compartilhou sua revista manuscrita com as pessoas com quem vivia, a família que o abrigava e, provavelmente, pessoas que o ajudaram fora da casa e outros judeus escondidos. Depois da guerra, à qual Bloch sobreviveu, ele reuniu suas revistas e as levou para casa e, finalmente, para Nova York, para onde emigrou. Ali estão, entre livros nas estantes, criações desconhecidas de um homem que não era poeta ou artista, mas sim advogado.
A filha de Bloch, Simone Bloch, hoje com 64 anos, ainda se lembra de ver as revistas na casa da família quando criança. Curt morreu de uma doença hepática quando ela tinha 15 anos. Muitos anos depois, porém, a filha de Simone, Lucy, se interessou pelas revistas, não apenas como registros de família, mas como registros históricos. Ela conseguiu uma bolsa de pesquisa para viajar para a Alemanha, onde pude estudar mais sobre a história do avô. Simone e Lucy então passaram anos à procura de uma forma de divulgar as revistas, um dos poucos esforços literários até então desconhecidos que documentam o Holocausto na Europa.