03.10.25 | Brasil

“O silêncio do Brasil”

Editorial de O Estado de S.Paulo desta sexta (3) critica a demora do presidente Lula em se pronunciar oficialmente sobre o plano de Trump para Gaza, apoiado até pelo papa. Leia a seguir a íntegra do texto:

Na ONU, o presidente Lula da Silva foi ovacionado ao discursar de maneira contundente, entre outros temas, contra a ação de Israel em Gaza. Mas, quando se abriu a primeira janela de paz real para Gaza, o petista calou-se. Grande na tribuna, pequeno na ação.

Na segunda-feira, o presidente americano, Donald Trump, apresentou a proposta mais abrangente até agora para solucionar o conflito. Aceita por Israel, ela responde consistentemente a duas questões cruciais: como encerrar o combate, com a devolução imediata dos reféns israelenses, e como organizar a reconstrução e a governança de Gaza com vistas à criação de um Estado palestino. Seria de esperar que Lula abraçasse efusivamente a oportunidade. Mas, pelo jeito, ele prefere perorar sobre o “genocídio” a encerrá-lo.

Na quarta-feira, numa comunicação em audiência na Câmara, o chanceler Mauro Vieira fez longas recriminações a Israel, mas não citou o plano. Segundo apuração de O Globo, a diretriz era esperar a posição do Hamas, o que seria condicionar a reação oficial do Brasil ao veredicto de um grupo terrorista. Questionado pelos deputados, Vieira se resignou a dizer que estava “acompanhando” o plano e pretendia “aplaudi-lo”. Quando este editorial foi ao prelo, a única nota recente do Itamaraty sobre o conflito era uma condenação a Israel por impedir uma flotilha de ativistas pró-palestinos de chegar a Gaza a pretexto de entregar ajuda humanitária.

Quando o governo se dignou a tomar conhecimento da proposta – segundo Vieira, na tarde de 30/9, mais de 24 horas após ser lançada –, ela já fora endossada, com ofertas de apoio, pela Autoridade Palestina, por grandes nações islâmicas e ocidentais, por potências como China, Rússia e Índia, por organismos multilaterais como a ONU e por lideranças religiosas, como o papa. Enquanto o Hamas sofre pressão máxima do mundo – incluindo patronos como Catar e Turquia –, o governo que se gaba de ser voz “ativa e altiva” no “Sul Global” silencia.

Assim como Lula nunca desce do palanque no Brasil, nunca desce do púlpito fora dele. Eis a diplomacia reduzida a espetáculo de autopromoção: verborrágica ao posar de tribuno anti-imperialista, mas titubeante quando os fatos exigem pragmatismo; indignada contra Israel, mas condescendente com Hamas, Irã ou Hezbollah; furiosa ao cobrar protagonismo, mas tímida quando pode ser protagonista. O multilateralismo é exaltado na teoria e descartado na prática, justamente quando uma articulação internacional se materializa.

Para Lula, o desfecho do drama importa menos que o figurino dos atores. Se os “fascistas” Trump e o premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, rubricam a embalagem do remédio, para Lula ele vira veneno.

Enquanto o mundo desperta e pressiona o Hamas a escolher entre a rendição que pode alicerçar um futuro digno para Gaza ou a imolação que pode soterrá-lo, Lula hesita. Quem mais perde não é Trump nem Netanyahu: são os palestinos, mantidos como peças num tabuleiro em que Brasília só joga para consumo interno.

De nada servem proclamações “históricas” se, quando a História bate à porta, o Brasil emudece. Esta é a hora em que estadistas trocam aplausos por ações. Mas a diplomacia lulista não se guia por avanços no terreno, só por flashes no palco. O resto é silêncio.


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