05.07.16 |

'PELO DIREITO DE DEFESA', por Sócrates Nolasco

Silvio Romero, em seu pronunciamento feito no Congresso Pan-Americano [1901], disse : que &ldquo:um dos ví:cios, um dos despropó:sitos mais comuns e mais espalhados do espí:rito revolucioná:rio e demagó:gico moderno, é: esse terrí:vel dualismo, essa insensata e mesquinha antinomia, proclamada em todos os tons e a toda hora, entre o povo e o seu governo, entre as naç:õ:es e aqueles que a dirigem, como duas forç:as irreconciliá:veis, fatalmente inimigas, fadadas a guerrearem-se a todo momento, em todo o curso da histó:ria.&rdquo:

Nã:o mudou muita coisa de lá: para cá:. Neste discurso, Romero apontou o que posteriormente iria definir a cena contemporâ:nea: um antagonismo de forma rasa que tenta colocar a opiniã:o no lugar do argumento, como se fossem equivalentes e tivessem o mesmo valor.

Transformar o Sr. Thomas de Toledo em ví:tima da situaç:ã:o que ele criou, é: uma opiniã:o que desconsidera o argumento de que ele foi acionado judicialmente para responder por seus atos perante a leis que protegem o cidadã:o de atitudes racistas.

A narrativa persecutó:ria que o texto dos Sr. Marcos Tenó:rio e da Sra. Baby Siqueira Abrã:o segue, baseia-se na velha ideia de conspiraç:ã:o: os dedos de Israel e dos EEUU entraram no Brasil, para retirar dele sua presidente. Nã:o foram os atos da presidente que a afastaram do governo, mas &ldquo:dedos vindos de fora&rdquo:. Com tantos dedos pelo mundo, foram os de Israel que vieram parar aqui. Nã:o é: a primeira vez que a associaç:ã:o entre os EEUU e judeus é: feita, ela també:m apareceu na Alemanha nazista, difundida pela ideia de conspiraç:ã:o por intermé:dio da propaganda nazista.

As crí:ticas feitas a FIERJ, pelos autores do texto que tomaram as dores do Sr. Toledo, nã:o consideram que a FIERJ é: composta por brasileiros, pois se assim a considerassem, nã:o seria necessá:rio fazer menç:ã:o ao &ldquo:paí:s onde ela está: sediada&rdquo:, como se ela tivesse vindo de fora e aberto uma sede aqui. : Nã:o há: um antagonismo entre a FIERJ e o Brasil, pois um é: parte do outro. : Contudo, isto revela um pouco mais sobre o ponto de vista de algumas pessoas que insistem em separar brasileiros judeus do paí:s onde vivem. É: exatamente esta atitude que caracteriza o preconceito e o racismo.

O texto rapidamente deixa de lado os argumentos da defesa do Sr. Toledo, para dedicar-se as questõ:es da Palestina, o imbró:glio com a CIA e o Mossad, numa tentativa de demonizar Israel e isentar Toledo das consequê:ncias de seus atos. Na falta de argumento para sustentar a tese de que Israel e os EEUU conspiram contra o Brasil, o antagonismo e a maledicê:ncia sã:o usados para encobrir uma opiniã:o apoiada no preconceito, no racismo e no antissemitismo.

A defesa do Sr. Toledo é: apresentada por um misto de assuntos sobrepostos, colados uns sobre os outros, cuja intenç:ã:o seria defender um ponto de vista que poderia ter sido interessante debater, se nã:o estivesse comprometido em livrar o atual governo da responsabilidade pelo que fez ao Brasil. Como fazer isto? Seria necessá:rio culpar os dedos de algué:m de fora. Diga-se de passagem, que esta associaç:ã:o també:m foi feita pelo partido nacional-socialista alemã:o. Nã:o é: a primeira vez que se atribui aos judeus a responsabilidade pela situaç:ã:o na qual se encontra um paí:s.

Os autores do texto conseguiram até: inventar uma comunidade judaica na qual judeus e Israel sã:o tratados separadamente, como se os motivos que levaram a fundaç:ã:o do estado pudessem deixar de lado a histó:ria dos judeus. O modo como eles entendem o Estado de Israel nã:o corresponde a histó:ria de sua fundaç:ã:o e só: corrobora com uma ideia antissemita, usada como eixo para defender Sr. Toledo. Nã:o foi a FIERJ que impô:s censura, mas as leis brasileiras criadas para inibir o racismo.

Tentar transformar o Sr. Toledo em ví:tima expiató:ria, defensor dos mais nobres ideais civilizató:rios e perseguido pela FIERJ, faz parte de uma estraté:gia moralmente limitada e precá:ria, pois se assim nã:o fosse, os autores do Sr. Toledo, teriam tido mais cuidado ao pensar que a ideia conspirató:ria nã:o tem qualquer base de sustentaç:ã:o. Fato é: que muitos continuam nã:o aceitando a criaç:ã:o do Estado de Israel, e o fazem por meio da vitimizaç:ã:o da Palestina ou da derrubada de um governo que caiu sozinho. O governo Dilma quando se recusou a aceitar o embaixador israelense, reiterou a postura de nã:o aceitaç:ã:o da existê:ncia de um estado judeu autô:nomo, e sob o disfarce da causa palestina, ela tentou intervir em uma questã:o interna, ferindo a soberania defendida por ela.

Felizmente, nem todos os brasileiros pensam assim. O Brasil participou da fundaç:ã:o do estado de Israel, e seu voto foi decisivo para criaç:ã:o do mesmo. Sabemos que o Oriente Mé:dio desde o final de 1940 vive turbulê:ncias, e na é:poca, os á:rabes simpatizavam com as potê:ncias do eixo. Viam na vitó:ria alemã: uma oportunidade para livrarem-se da dominaç:ã:o inglesa e com isso, eliminar a presenç:a dos judeus na Palestina. Diga-se de passagem, haviam judeus na Filistina, muito antes da fundaç:ã:o do estado.

Por sua vez, em 1945, apó:s a queda de Getú:lio Vargas, o General Dutra foi eleito presidente do Brasil. Em 1946, Oswaldo Aranha foi convidado para chefiar a delegaç:ã:o brasileira na Conferê:ncia das 21 naç:õ:es, em 1947. Aranha recusou, e Joã:o Neves participou da Conferê:ncia. Ele foi aconselhado a abster-se sobre esta questã:o, pois os á:rabes nã:o estavam de acordo com a resoluç:ã:o da partilha. : Mesmo assim, um estado judeu e um palestino foram criados. O plano de partilha foi rejeitado pelos á:rabes, e a Liga dos Estados Á:rabes declarou que iria impedir a consolidaç:ã:o da resoluç:ã:o da ONU. Como fazem os autores do texto contrá:rio a reaç:ã:o da FIERJ. Eles atacam e acham que podem inibir o direito de defesa.

Contudo, a resposta foi restaurada por um novo Comitê: (UNSCOP), que elaborou um relató:rio final. Em novembro de 1947, a ONU sancionou o plano de partilha da Palestina com apoio de dois terç:os dos representantes. Os Estados Unidos e a Uniã:o Sovié:tica foram favorá:veis à: resoluç:ã:o que estabelecia um fim para o mandato britâ:nico sobre a Palestina e a divisã:o das terras em dois estados. Dois dias sem resoluç:ã:o. O presidente da sessã:o, Oswaldo Aranha, desempatou a votaç:ã:o decidindo a favor da criaç:ã:o de dois estados.

À:s vé:speras do final do mandato britâ:nico, com os judeus prometendo fazer cumprir a partilha aprovada pelas Naç:õ:es Unidas, a Liga Á:rabe sentiu-se no direito de invadir a Palestina para restaurá:-la exclusivamente aos á:rabes. Azzam Pasha, o secretá:rio-geral da entidade, anunciou que eliminaria aqueles que considerava inimigos, disse ele: ":conduziremos um massacre para rivalizar com aqueles conduzidos pelas hordas mongó:is":. : Lamentavelmente, os defensores do Sr. Toledo nã:o levaram nada disto em conta, porque pensam do mesmo modo que Pasha.

Os autores da defesa do Sr. Toledo, fazem o mesmo que os membros da Liga Á:rabe, na declaraç:ã:o de invasã:o no dia 15 de maio, usaram a seguranç:a dos palestinos como justificativa para dar iní:cio a guerra. Sem uma coordenaç:ã:o de fato, o rei Abdullah da Transjordâ:nia se autoproclamou comandante dos exé:rcitos á:rabes. Os palestinos novamente foram esquecidos, do mesmo modo como faz o Hamas, e para desespero dos palestinos, as manobras militares beneficiavam os lí:deres e nã:o os habitantes muç:ulmanos que viviam na Filistina. :

A debandada civil da Filistina tem uma explicaç:ã:o bem mais palpá:vel: o colapso das instituiç:õ:es á:rabes na Palestina no final do mandato britâ:nico, com a fuga de seus principais lí:deres. Juí:zes, mukhtars, cá:dis e outras autoridades foram os primeiros a abandonar cidades como Haifa, Jaffa e a Cidade Nova de Jerusalé:m.

Há: muitos anos atrá:s, a questã:o da Palestina dividiu as Naç:õ:es quando muitas lideranç:as, atualmente no poder, eram crianç:as ou sequer haviam nascido. Foram 33 votos a favor, 13 contra e dez abstenç:õ:es na votaç:ã:o da Partilha, que culminou na criaç:ã:o do Estado de Israel.

Entre os que nã:o apoiaram a divisã:o, alé:m dos paí:ses á:rabes, estavam a Grã: Bretanha, Gré:cia, Turquia, Argentina, China, Mé:xico, Colô:mbia, Chile e Cuba. Mas Estados Unidos e Uniã:o Sovié:tica, duas grandes potê:ncias na é:poca, defendiam a partilha da Palestina histó:rica em um Estado judaico e outro á:rabe.

Como Moscou e Washington, o Brasil se posicionou a favor da divisã:o. Um dos responsá:veis pela aprovaç:ã:o da partilha que culminou na criaç:ã:o do Estado de Israel foi o embaixador Osvaldo Aranha, que presidiu a sessã:o histó:rica da Assembleia Geral da ONU. Sem os esforç:os do diplomata brasileiro nos dias que antecederam o voto, talvez os judeus nã:o tivessem conseguido o reconhecimento do Estado judaico na comunidade internacional.

O argumento de que os á:rabes eram maioria mesmo no Estado judeu nã:o convenceu Aranha. Camille Chamoun, embaixador do Lí:bano junto à:s Naç:õ:es Unidas, que viria a ser presidente libanê:s, tentou se reunir com o diplomata brasileiro para pelo menos adiar a votaç:ã:o, mas foi ignorado. Por fim, o embaixador do Brasil entrou para a histó:ria e hoje dá: nome a um kibutz e a uma praç:a em Israel.

Os á:rabes talvez tivessem mais sorte se outra naç:ã:o da Amé:rica Latina estivesse na presidê:ncia da Assembleia Geral. O Chile, por exemplo, tinha uma das maiores comunidades palestinas da diá:spora. O PRI mexicano, assim como Juan Domingo Peró:n, na Argentina, mantinha boas relaç:õ:es com o mundo á:rabe. Cuba vivia um hiato dentro da ditadura de Fulgencio Baptista, sendo governado pelo populista Ramon Grau San Martin.

Vale lembrar que judeus compraram muitas terras dos á:rabes onde hoje existe o estado de Israel. A famí:lia Rothschild doou um montante de dinheiro que foi usado para comprar pâ:ntanos e deserto que foram ocupados por jovens judeus da Europa oriental fugidos das perseguiç:õ:es. : Naquela é:poca, os á:rabes que vendiam terras e os judeus que as compravam, conviviam pacificamente, o que levou, entre os anos de 1904 e 1914, aproximadamente 60 mil judeus a migrarem para as terras compradas. No dia 14 de maio de 1948, seis horas antes do té:rmino do Mandato Britâ:nico, David Ben Gurion leu a declaraç:ã:o de independê:ncia de Israel.

No dia seguinte à: independê:ncia, os á:rabes atacaram Israel perdendo pela primeira vez esta batalha. Por conta desta guerra que nã:o começ:aram, os judeus conquistaram 78% do antigo territó:rio palestino (22% a mais do previsto na partilha). As guerras trazem consequê:ncias como estas. Todas as fronteiras que hoje definem cada paí:s do mundo foram demarcadas do mesmo modo. : Em 1949 foi feito o primeiro acordo de paz entre á:rabes e Israel, reconhecido pelo Brasil e pela comunidade internacional.

O antissemitismo que antecede a criaç:ã:o do estado de Israel ignora a histó:ria dos judeus, inventa uma histó:ria de má:goas e ressentimentos para se sobrepor a ela, e justificar o ataque aos judeus, exigindo ainda que se ignore o direito defesa. Infelizmente muitos nã:o toleram a ideia de que os judeus espalhados pelo mundo tê:m direitos como qualquer cidadã:o do paí:s onde residem. Contudo, felizmente os judeus aprenderam a lutar pelos seus direitos, como o faz qualquer cidadã:o de qualquer paí:s.

Na versã:o contemporâ:nea, o antissemitismo se traveste no ataque ao Estado Judeu. É: possí:vel vê:-lo presente nas palavras do Sr. Toledo e de seus defensores. Falar do BDS, da comunidade internacional, do sionismo, da devoluç:ã:o de terras, é: tentar retirar dos judeus o que foi conquistado com luta e trabalho, preservando assim as mesmas reaç:õ:es contrá:rias a criaç:ã:o dos dois estados. Nenhum deles aceita a criaç:ã:o do Estado de Israel.

Vale lembrar que, em junho do ano 1967, Israel foi atacado pelo Egito, pela Sí:ria e posteriormente pela Jordâ:nia. Derrotada por Israel, a Jordâ:nia perdeu a Cisjordâ:nia. O que os autores do texto maliciosamente deixam de fora. As terras nã:o foram ocupadas, elas sã:o frutos de uma conquista causada por uma guerra que nã:o foi iniciada por Israel.

A FIERJ fez valer os direitos dos brasileiros quando tomou as providencias necessá:rias contra a opiniã:o que atribui aos judeus brasileiros a queda do governo Dilma. Aqui, nã:o só: todos tê:m direito de defesa, como sã:o iguais perante a Constituiç:ã:o em vigor. Tentar transformar o que é: de direito em censura é: subverter os princí:pios constitucionais. Ilusoriamente aqueles que assim o fazem, agem deste modo porque pensam estar acima da lei. Este tempo já: passou. : :

Só:crates Nolasco, Ph.D.


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